Um Very Typical Provincianismo
Lisboa é provinciana. Muitos pensam que esta cidade não passa de um resíduo de pessoas indiferentes, apressadas demais para darem atenção aos outros. Que esta cidade não passa de um antro cosmopolita, frio, desumano... Mas enganam-se. Lisboa é provinciana.
Lisboa é aquele local, onde quem a atravessar de autocarro descobre as pequenas características que a tornam tão rural. As velhas que desfiam rosários de doenças umas às outras, o menor motivo que origina a mais acesa discussão, e por consequência conversas com o vizinho do lado, que por sua vez vão desembocar em verdadeiras confissões sobre a vida privada. Em Lisboa, apesar de tudo, ainda há pessoas atentas aos passos que os outros dão. Predispostas a estender a mão para ajudar. Predispostas a criticar, sem sequer terem conhecimento de causa. Um espírito provinciano numa capital que um dia foi de um império.
Lisboa é aquele local onde ainda há bairros em que se acorda ao domingo de manhã com os gritos das crianças a brincarem na rua, as vizinhas a trocarem mexericos, os homens a encontrarem-se no café e a discutirem os assuntos da actualidade, percebam ou não alguma coisa do assunto. Em Lisboa, apesar da cidade estar a ser cada vez mais desertada de pessoas, ainda se encontram pessoas à janela a ver quem passa. O senhor da mercearia a aviar clientes, com conversas pessoais. A senhora do café que ainda faz fiado a quem precisa. A mulher da padaria a quem todos contam os seus desaires.
E para acrescentar o provincianismo a todo este provincianismo, Lisboa tem um presidente de Câmara, altamente folclórico. Ele é cartazes gigantescos e coloridos a propagandearem os seus feitos, ele é colunas espalhadas pela Baixa, a darem música aos transeúntes, como qualquer terra mais pequena em dia de feira...
Mas será isto mau? Será mau haver, apesar de tudo, uma dimensão humana? Uma sensação de que este espírito tacanho está ali para o melhor e para o pior? Sem ter ainda alcançado o desprendimento e a falta de contacto humano que se encontram em algumas capitais pelo mundo fora?
A meu ver, eu que sou lisboeta e que por isso tenho também um espírito provinciano, a meu ver, tirando o folclore, não me parece assim tão mau.
domingo, fevereiro 29, 2004
quarta-feira, fevereiro 18, 2004
Os Abortos
Também não sou a favor do aborto. Acho que de forma alguma, uma mulher deveria por termo a uma vida. Ainda por cima que ela própria gerou. Mas compreendo que algumas mulheres tenham que o fazer. Compreendo o azar, a impossibilidade, a necessidade.
O que não compreendo é a inconsciência e a irresponsabilidade. A inconsciência de se ter relações, sem meios anti-concepcionais, se não se quer procriar, a irresponsabilidade de não se prever esse género de situações. Tãopouco compreendo o egoísmo, que associo à irresponsabilidade.
Ainda o outro dia, numa igreja de Lisboa, ouvi um padre falar acerca da preocupação do Estado, relativamente à educação sexual. Defendia ele, que o que se devia fazer era preocupar-se em ensinar às pessoas a importância do casamento e da procriação a partir dele. O padre, até tem alguma razão. Mas é apenas numa pequena parte da sua argumentação.
De facto é necessária a educação sexual no nosso país. Os tabús que regem a vida nacional, já foram um pouco longe demais. É incompreensível que num país, dito, do primeiro mundo, ainda haja mães adoloscentes, o número de infectados com o HIV cresça constantemente e que ainda se façam abortos na ilegalidade. Sem meios e sem condições.
É necessário que os jovens aprendam a responsabilizar-se pelos seus actos e para isso é necessário que lhes sejam dadas as ferramentas para poderem funcionar com a sua vida. Não é fechando os olhos, que eles vão deixar de cometer erros.
É necessário que as mulheres aprendam a dizer 'não' a uma relação sem meios anti-concepcionais, se não querem ter filhos. Porque o jogo da roleta russa é muito sério.
A prática do aborto não pode ser um crime. Porque se assim é, da mesma forma é um crime dar crianças para instituições, num país em que a burocracia só há pouco permitiu facilitar o processo de adopções. Da mesma forma é um crime não dar condições às crianças, para elas crescerem com tudo a que têm direito, com os respectivos progenitores e todo o afecto que merecem.
O problema neste país, é que existe um constante encolher de ombros e tudo se justifica como uma questão de azar. Não é azar uma menina engravidar aos 13 anos. É falta de conhecimentos. Falta de atenção. Falta de educação. Não é azar uma mulher de 30 anos engravidar, se não usou os meios anti-concepcionais necessários: é irresponsabilidade. É inconsciência.
Despenalizar o aborto? Acho que sim. Andam tantos por aí em liberdade...
Também não sou a favor do aborto. Acho que de forma alguma, uma mulher deveria por termo a uma vida. Ainda por cima que ela própria gerou. Mas compreendo que algumas mulheres tenham que o fazer. Compreendo o azar, a impossibilidade, a necessidade.
O que não compreendo é a inconsciência e a irresponsabilidade. A inconsciência de se ter relações, sem meios anti-concepcionais, se não se quer procriar, a irresponsabilidade de não se prever esse género de situações. Tãopouco compreendo o egoísmo, que associo à irresponsabilidade.
Ainda o outro dia, numa igreja de Lisboa, ouvi um padre falar acerca da preocupação do Estado, relativamente à educação sexual. Defendia ele, que o que se devia fazer era preocupar-se em ensinar às pessoas a importância do casamento e da procriação a partir dele. O padre, até tem alguma razão. Mas é apenas numa pequena parte da sua argumentação.
De facto é necessária a educação sexual no nosso país. Os tabús que regem a vida nacional, já foram um pouco longe demais. É incompreensível que num país, dito, do primeiro mundo, ainda haja mães adoloscentes, o número de infectados com o HIV cresça constantemente e que ainda se façam abortos na ilegalidade. Sem meios e sem condições.
É necessário que os jovens aprendam a responsabilizar-se pelos seus actos e para isso é necessário que lhes sejam dadas as ferramentas para poderem funcionar com a sua vida. Não é fechando os olhos, que eles vão deixar de cometer erros.
É necessário que as mulheres aprendam a dizer 'não' a uma relação sem meios anti-concepcionais, se não querem ter filhos. Porque o jogo da roleta russa é muito sério.
A prática do aborto não pode ser um crime. Porque se assim é, da mesma forma é um crime dar crianças para instituições, num país em que a burocracia só há pouco permitiu facilitar o processo de adopções. Da mesma forma é um crime não dar condições às crianças, para elas crescerem com tudo a que têm direito, com os respectivos progenitores e todo o afecto que merecem.
O problema neste país, é que existe um constante encolher de ombros e tudo se justifica como uma questão de azar. Não é azar uma menina engravidar aos 13 anos. É falta de conhecimentos. Falta de atenção. Falta de educação. Não é azar uma mulher de 30 anos engravidar, se não usou os meios anti-concepcionais necessários: é irresponsabilidade. É inconsciência.
Despenalizar o aborto? Acho que sim. Andam tantos por aí em liberdade...
sexta-feira, fevereiro 13, 2004
Orgulho Nacional
O professor Marcelo Rebelo de Sousa falava o outro dia em fazer alguma coisa pela auto-estima portuguesa. Saber o que fazem os portugueses de bom, para nos orgulharmos do país que temos.
como podemos nós orgulharmo-nos do país que temos? da gente que somos? Durante anos, andámos a gramar com a malvada filosofia do miserabilismo: a casinha humilde e pobre, mas feliz, o povinho pobre, analfabeto, humilde, mas feliz. A casa portuguesa concerteza, um humilde primeiro andar a contar vindo do céu, modesto, mas feliz...
e por outro lado, andava a nata da sociedade a divertir-se à grande, em sumptuosas festas, vidas, barcos e luxos. e o povinho a achar que não tinha sido fadado para a mesma sorte.
um dia, enchem-nos a vida com revistas onde só se fala da vida dos ricos, cheias de fotos coloridas, ficamos a saber quem se divorciou de quem, porquê, com quem vai casar a seguir, porquê... dão-nos a oportunidade de ficar célebre em cerca de três meses. E de ter direito a opinar sobre tudo e mais alguma coisa.
Que diabo! Neste momento, nem sequer sabemos o que é o orgulho. Podia garantir que agora, exactamente agora, andamos à procura de uma identidade nacional.
E enquanto alguns saudosistas procuram o passado, criticam o presente, temem o futuro, enquanto alguns desdenham a realidade nacional pela pobreza espiritual que ela representa, enquanto alguns fecham os olhos e ignoram, enquanto alguns se esforçam para que essa realidade se mantenha assim, à laia de circo romano, o povo continua alegremente a sua peregrinação pelo vazio. Pela fama fácil de cinco minutos de audiência, pelo retrato na revista, pela presença nos talk-shows. É simples. É quase barato. Só não dá é milhões... e as empresas vão fechando... as famílias vão indo para a fome... o déficit será alcançado um dia, sem dúvida. Mas a que preço? E quem é que o vai pagar?
Já diria um cantor famoso: 'aqui na terra estão jogando futebol, tem muito samba, muito choro e rock n' roll, uns dias chove, noutros dias bate sol, mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta... ', por aqui está mais colorida... porque já não há televisões a preto e branco.
O professor Marcelo Rebelo de Sousa falava o outro dia em fazer alguma coisa pela auto-estima portuguesa. Saber o que fazem os portugueses de bom, para nos orgulharmos do país que temos.
como podemos nós orgulharmo-nos do país que temos? da gente que somos? Durante anos, andámos a gramar com a malvada filosofia do miserabilismo: a casinha humilde e pobre, mas feliz, o povinho pobre, analfabeto, humilde, mas feliz. A casa portuguesa concerteza, um humilde primeiro andar a contar vindo do céu, modesto, mas feliz...
e por outro lado, andava a nata da sociedade a divertir-se à grande, em sumptuosas festas, vidas, barcos e luxos. e o povinho a achar que não tinha sido fadado para a mesma sorte.
um dia, enchem-nos a vida com revistas onde só se fala da vida dos ricos, cheias de fotos coloridas, ficamos a saber quem se divorciou de quem, porquê, com quem vai casar a seguir, porquê... dão-nos a oportunidade de ficar célebre em cerca de três meses. E de ter direito a opinar sobre tudo e mais alguma coisa.
Que diabo! Neste momento, nem sequer sabemos o que é o orgulho. Podia garantir que agora, exactamente agora, andamos à procura de uma identidade nacional.
E enquanto alguns saudosistas procuram o passado, criticam o presente, temem o futuro, enquanto alguns desdenham a realidade nacional pela pobreza espiritual que ela representa, enquanto alguns fecham os olhos e ignoram, enquanto alguns se esforçam para que essa realidade se mantenha assim, à laia de circo romano, o povo continua alegremente a sua peregrinação pelo vazio. Pela fama fácil de cinco minutos de audiência, pelo retrato na revista, pela presença nos talk-shows. É simples. É quase barato. Só não dá é milhões... e as empresas vão fechando... as famílias vão indo para a fome... o déficit será alcançado um dia, sem dúvida. Mas a que preço? E quem é que o vai pagar?
Já diria um cantor famoso: 'aqui na terra estão jogando futebol, tem muito samba, muito choro e rock n' roll, uns dias chove, noutros dias bate sol, mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta... ', por aqui está mais colorida... porque já não há televisões a preto e branco.
terça-feira, fevereiro 10, 2004
alívio
agora sim... acabei de chegar. estou na sombra, por isso, à partida, não há quaisquer ameaças.
Gosto de Lisboa. É a minha cidade. São as minhas ruas, as lojas, a luz. É tudo meu. Quando subo à Senhora do Monte, sinto que consigo abarcar a cidade toda, só abrindo os braços. E depois, detesto Lisboa, os lisboetas, a confusão do trânsito, a miséria que se vê, a pobreza das almas, o confluir de tudo em nada. Saber de cor e em salteado as ladaínhas dos pobres do metro, a infelicidade das meninas das lojas, a diferenciação dada a quem chega com roupas caras, olha de alto, e trata com arrogância. Lisboa é um caos. Uma província. Um cantinho no mundo, cheio de pequenas pessoas. Fizeram bem em ter escolhido a Rua Augusta para algumas cenas do Gulliver. Também acho que até certo ponto somos todos mentalmente liliputianos...
agora sim... acabei de chegar. estou na sombra, por isso, à partida, não há quaisquer ameaças.
Gosto de Lisboa. É a minha cidade. São as minhas ruas, as lojas, a luz. É tudo meu. Quando subo à Senhora do Monte, sinto que consigo abarcar a cidade toda, só abrindo os braços. E depois, detesto Lisboa, os lisboetas, a confusão do trânsito, a miséria que se vê, a pobreza das almas, o confluir de tudo em nada. Saber de cor e em salteado as ladaínhas dos pobres do metro, a infelicidade das meninas das lojas, a diferenciação dada a quem chega com roupas caras, olha de alto, e trata com arrogância. Lisboa é um caos. Uma província. Um cantinho no mundo, cheio de pequenas pessoas. Fizeram bem em ter escolhido a Rua Augusta para algumas cenas do Gulliver. Também acho que até certo ponto somos todos mentalmente liliputianos...
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